“Coimbra não tem sabido escolher os melhores caminhos e as melhores personalidades”
Mário Ruivo - O que está por trás é a necessidade que existe no PS de voltarmos às referências ideológicas, aos valores aos princípios fundamentais. É essa a base da candidatura e a possibilidade que tem de ser concedida num partido de ter um debate político, aberto e plural, virado para a solidariedade e para a articulação com a sociedade civil.
DC - Que balanço faz dos últimos mandatos da Federação Distrital?
MR - Muito bem. Tenho assistido às maiores manifestações de marketing e de utilização de referências. Mas, os militantes são pessoas ligadas ao partido e pensam pela sua cabeça. E tomam as posições sem seguirem as referências. Este também foi um dos objectivos. Não excluir ninguém, mas já se sabe que terá de passar por uma fase de ruptura com personalidades ligadas ao aparelho.
DC - Quer concretizar a questão das manifestações de marketing...
MR - Quando se começam a invocar apoios, números de apoios e um conjunto de elementos que possam criar a ilusão da vitória, quando as pessoas têm de avaliar o que estão a tentar esconder. Se estiverem atentos, percebe-se que algo se está a tentar esconder.
MR - O seu desgaste, a sua falta de consistência e, o que é preocupante, as suas verdadeiras razões de candidatura. Fundamentalmente a tentar iludir com um conjunto de promessas situações em que se utilizam as fragilidades de alguns militantes que precisam da solidariedade do partido. Mas, pelo menos espero que cumpram todas as promessas antes das eleições.
DC - Mas já o têm acusado de utilizar o seu cargo na Segurança Social em proveito da sua candidatura...
MR - Já assisti às mais disparatadas acusações e isso é puxar o debate para o campo onde ele (Victor Baptista) sempre germinou, que é o debate pessoal, da pura intriga e maldicência. Como dizia o secretário geral a pior coisa é a política medíocre e da mera acusação sem qualquer fundamentação e muitas das vezes isso não é mais do que o resultado dos nossos fantasmas pessoais.
DC - E quais são, então, as verdadeiras razões da recandidatura do presidente da distrital?
MR - Mário Soares dizia há algumas semanas que há uma noção hoje da chamada política do imediato, da “real politic”, do sucesso a todo o custo. Mas eu sou de Esquerda e até tenho mais anos de militância socialista do que Victor Baptista. Isso não é relevante em termos de militância mas é-o no que são os princípios e a forma de estar na política. Convivi com personalidades do PS que desde o início me transmitiram que a política se faz de valores e de princípios e este jogo de poder é a consequência da afirmação e da vitória das ideias que nós queremos desenvolver. Não pode ser ao contrário. Não pode ser ter o poder para depois impormos as ideias. Isso é próprio dos regimes ditatoriais. O poder tem de ser uma consequência.
MR - Dizer a verdade aos militantes, ser frontal nas posições assumidas e voltar aos valores da esquerda, valores sociais para que se possa quebrar o desencanto da população face aos políticos. Hoje a população não acredita nos políticos. Este é um estigma criado fruto de um conjunto de procedimentos mas os políticos também têm dado um contributo importante para essa descredibilização. Os eleitores têm de acreditar nos projectos e nas pessoas e essas pessoas têm de saber que estão mandatadas para cumprir o que andaram a prometer. Vou garantir que os militantes serão respeitados, que as estruturas serão respeitadas e que as escolhas serão feitas ouvindo todos os que têm de ser ouvidos e não andarmos a fazer negociações ou meras imposições de personalidades. Repare, o que distingue a esquerda da direita é que a esquerda vive dos valores e a direita vive dos interesses. Mas, como dizia há dias o meu camarada Manuel da Costa, há aqui uma outra nota determinante da diferenciação. É que a pessoa de esquerda tem desapego do poder e quando entende que há outros melhores para desenvolver a sociedade e o partido não tem problemas em sair e voltar à militância de base. Um elemento com ideias de direita, defensor dos interesses e do poder, tenta não largar o poder a todo o custo.
DC - Quais são os objectivos mínimos para a futura Federação Distrital as próximas três eleições?
MR - Ajudar o PS a nível nacional a ganhar com maioria absoluta as legislativas, fruto do trabalho sério desenvolvido no país, ganhar as europeias e obviamente tentar manter as Câmaras do PS e conquistar mais algumas. Mas, atenção, não há salvadores de última hora e não se ganham eleições em seis meses. As escolhas para as câmaras já deviam estar no terreno há algum tempo, mesmo que em circuito fechado, debatidas e escolhidas. Devia haver uma orientação da federação para que em cada concelho já estivesse definido o perfil e o putativo candidato para se começar a fazer trabalho político.
DC - Sim, mas a nível local, concretize a “meta”.
MR - Nas legislativas ter seis deputados eleitos é um óptimo resultado. A ambição tem de ser manter. Nas Câmaras, devemos manter as que temos e ganhar pelo menos mais duas ou três, Coimbra, Figueira da Foz, Oliveira do Hospital e também acredito na possibilidade de conquistar a Câmara de Arganil.
DC - Coimbra tem perdido importância no panorama nacional. Uma questão agravada com as saídas de vários organismos do Estado.
MR - É tudo consequência. Coimbra, o distrito, tem perdido alguma importância a nível nacional porque Coimbra não tem sabido escolher os melhores caminhos e as melhores personalidades para defender o distrito. É o problema de deixarmos de andar neste processo das escolhas em função dos amigos, das relações pessoais, dos interesses em vez de escolhermos os que devem ser os verdadeiros protagonistas nem que para isso tenhamos de ficar na retaguarda. Nas listas é tão importante o primeiro como o décimo de uma lista. Todos têm de ser acarinhados porque deram um contributo importante.
MR - Aproveitar, por exemplo, a floresta porque é uma das grandes riquezas que temos. Mas, fundamentalmente, já o referi, há uma relação a criar entre a sociedade empresarial, a universidade e os políticos. Têm todos que fazer um debate alargado. A Universidade de Coimbra também necessita de ganhar confiança nesta relação com as empresas, com os concelhos, com as potencialidades de conhecimento, com os recursos disponíveis. Por isso tenho organizado vários debates. Ninguém pode ter a solução e vir prometer não sei quantos postos de trabalho. Não se resolve assim. Tem de se deixar de pensar na política do imediato e pensar sim em projectos que, por exemplo, ajudem à fixação da população, uma vez que a desertificação é um problema em crescimento. Nestes debates, tenho encontrado um conjunto de pessoas, entre elas muitos jovens, que têm apresentado contributos importantes que vão ser utilizados para um fórum que vamos organizar a 11 de Outubro. Pessoas que não vinham antes ao partido porque não havia debate.
DC - Para terminar, perguntava-lhe se tal como aconteceu na concelhia de Coimbra também na Federação Distrital, após uma campanha “quente e aguerrida”, será possível registar-se uma pacificação e até uma convergência como sucedeu entre Henrique Fernandes e Carlos Cidade?
MR - A minha posição é a de tentar unir a grande família socialista. Como o meu debate não é de cariz pessoal, não tenho rancor nem entro na pequena política. Estou disponível para unir e acolher na federação todos aqueles que tragam contributos importantes e venham debater política.
Entrevista publicada no Diário de Coimbra – 30-09-2008
Feita por: João Luís Campos