Candidatura de Mário Ruivo
Ao escolhermos este dia 31 de Janeiro e não outro para aqui estarmos, não o fizemos de forma gratuita nem foi obra do acaso.
A sua dimensão, do mesmo modo que os revoltosos a 31 de Janeiro de 1891 se indignavam com a humilhação a que o utimatum inglês acabava de sujeitar a sociedade portuguesa, também nós, socialistas, incomodados com a paralisia descaracterizadora a que, aqui em Coimbra e, não só, vimos assistindo, nos aprestámos para vos dizer, aqui e agora, que não nos conformamos com este estado de coisas e, que para tal, não nos dispomos apenas e, tão só, a manifestar a nossa indignação.
Vimos aqui para vos afirmar a nossa determinação em contribuir para a inversão do estado a que as coisas chegaram, anunciando-vos o propósito em regenerar a prática política não só no seio no Nosso Partido, mas também no seio da sociedade em geral.
O exercício político é um acto de cidadania que a todos deve comprometer que não pode ser deixado ao livre arbítrio apenas de alguns.
O Partido Socialista aqui em Coimbra, graças ao empenho e participação de todos os seus militantes e de todos os seus simpatizantes, foi antes e depois do 25 de Abril uma das grandes referências locais e nacionais. Foi-o num tempo em que a defesa das causas públicas se sobrepunha à dos interesses pessoais.
Hoje, fonte de práticas e posturas inadequadas de uns, e, ao laxismo displicente de nós outros, o facto é que o Partido em Coimbra deixou de ser uma referência tanto a nível local como a nível nacional. A responsabilidade desta situação é de todos nós, que não nos empenhámos como podíamos e devíamos. Podíamos ter feito mais e não o fizemos. Agora, foi assim, que um grupo de nós, emanado de todos vós, num acto de imperativa consciência, parou para pensar mas para pensar de forma plural e em conjunto. Quero dizer-vos que durante os tempos de reuniões que realizámos, até aqui chegarmos hoje, discordámos muito, até nas virgulas, mas no que não discordámos nunca, foi da importância de aqui estarmos hoje e de vos anunciar a determinação de intervirmos para restituir ao Distrito um Partido Socialista credível, aberto à participação plural de todos os militantes e não militantes, de acordo com os seus saberes, as suas competências e as suas disponibilidades. Um Partido Socialista que estimule o debate em torno de propostas exequíveis para cada um dos 17 concelhos, para o distrito, para a região e, porque não, para o País. Só assim podemos ambicionar em voltar a ser um partido credível e dentro dele fazer emergir protagonistas de causas e saberes capazes de ombrear com os melhores em capacidade técnica, sensibilidade social e talento político.
Um PS onde nenhum dos militantes deixe de participar por exclusão provocada ou consentida. Coimbra tem que voltar a orgulhar-se do seu Partido Socialista. O Partido que era uma família, onde se discutia, se divergia mas não se excluía.
Para que tal aconteça, apelamos aos militantes, a todos os militantes, para que se não limitem a aderir. Propomos-lhes que intervenham na proposição e na defesa das “causas socialistas”. Não se acanhem nem se intimidem face às dúvidas e às incertezas que vos invadam o espírito. O mundo alterou-se e todos os dias somos confrontados com novos aconteceres, muitos deles a subverterem as filosofias até aqui prevalecentes. Os conceitos e as verdades que foram o sustentáculo da nossa formação e consciencialização fragilizam o nosso pensamento e inquietam a nossa consciência.
Se já nem as chamadas ciências exactas garantem sustentabilidade nos seus eventos, como podemos nós dar garantia às verdades tidas, até hoje, como expressão fiel da natureza das coisas, se, já hoje, alguns autores, apelidam as verdades de “construções sociais da realidade”?
Do mesmo modo que o fazemos para os militantes, roga-se aos simpatizantes o seu regular contributo e a permanente participação. Se queremos melhorar as coisas e/ou melhorar o mundo é preciso melhorar os partidos existentes ou substituí-los por outros, porque são estes o esteio da Nossa Democracia (como disse Winston Churchill: “a democracia é o pior de todos os regimes, exceptuando todos os outros”).
Foram todos estes imperativos que tocaram a nossa sensibilidade de militantes que nos impulsionou e vai empolgar em permanência ao envolvimento neste movimento que veio aqui hoje anunciar o propósito de dotar o distrito de Coimbra de uma Federação Nova e de esta Federação vir a ser liderada pelo camarada Mário Ruivo.
Porquê o Mário Ruivo? Porque analisados os perfis de todos nós, tendo em conta os saberes, as capacidades, as disponibilidades para executar as tarefas, a sensibilidade social face às causas em presença, a tolerância para ouvir e acatar a pluralidade de opiniões, o sentido de honorabilidade e até a paciência para nos aturar, foi nosso entendimento de que ele é o melhor. O Mário Ruivo é o primeiro protagonista! Mas não será o único nem disporá de tratamento privilegiado, por esse facto, só o terá por ser o primeiro responsável do PS no distrito e nos representar a todos junto do PS Nacional.
Outros, de acordo com as suas exigências curriculares, a seu tempo, emergirão para a assunção das funções inerentes ao funcionamento dos órgãos institucionais da Federação Distrital.
Do mesmo modo que a consciência (que outros têm sempre tranquila) me impulsionou para regressar a esta intervenção activa em prol do Partido, calhou) ou fez-se calhar que fosse eu a vir aqui transmitir-vos esta mensagem e fazer-vos o apelo à participação.
Aceitei de bom grado fazê-lo, já que o incómodo interior face ao funcionamento do Partido, em Coimbra, e, não só, era medonho a atormentador, levando-me mesmo a alguns estados de exasperação.
E não foi “o mais de esquerda” ou “o menos de esquerda” que me criou incómodos. Essa questão é uma “falácia de mau pagador”. O que me inquietou e inquieta é a ausência de exercício político no Nosso Partido que a nós todos obriga a fazer regressar.
As considerações que se seguem só a mim obrigam e comprometem, mas não me dispenso de as afirmar.
Foi na relação capital/trabalho que na sua origem o PS assentou a sua declaração de princípios, fundamentando aí a sua essência ideológica e fê-lo com superior elevação sustentando essa relação nesse valor supremo que para nós socialistas é a solidariedade, vertida depois nos textos que lhe deram expressão imperativa na chamada coesão social.
Com o rodar dos tempos, se calhar fruto das dinâmicas sociais, à época, essa relação passou a designar-se por relação laboral e nós tementes à anunciada flexissegurança, que aí vem, receamos que a primeira seja mandada às malvas e a outra atirada para as urtigas! Porque não recuperar essa relação primeira, convertendo-a numa exigência da própria cidadania como nos legou Fernando Valle?
Se calhar, também aqui, teremos que parar para pensar. Pensar colectivo! Pensar alto com bom som!
O PS não pode deixar que o tratem como uma espécie de sociedade anónima de capitais públicos defensora de interesses privados.
Eu sei que a Europa constrange a autonomia dos governos nacionais e que o seu modelo económico neo-liberal, agora suavizado do Tratado de Lisboa, designando-o por economia de mercado social, condiciona as políticas, mas nada impede que o PS, não como Governo que o é neste momento, mas como Partido afirme uma coerente fidelidade aos princípios que o notabilizaram como formação inter-classista promotor da solidariedade social.
Só assim, o Partido, com todas as suas estruturas a funcionar e a exprimirem-se se sentirá obrigado, não só, a apoiar, mas a ajudar o Seu Governo a implementar e/ou a corrigir as suas políticas explicando as medidas e informando as populações e/ou canalizando para o Governo os anseios, as carências e as propostas destas mesmas populações. Assiste-se a um role de contestações e desinformações que na maior parte dos casos eram evitáveis, já que são consequências da ausência de funcionamento do Partido em todos os seus graus e competências.
Permitam-me que antes de terminar estes considerandos, lance daqui um grito que é um chamamento à adesão e participação dos jovens na vida política activa.
Ninguém como eu, enquanto jovem do meu tempo, foi tão rebelde, tão contestatário e tão desalinhado, mas isso não foi impeditivo que me envolvesse nas causas e lutasse por elas.
Após o 25 de Abril cheguei a pertencer a 23 organizações, todas elas promotoras das mudanças, que se apregoavam. Não terei estado tão bem, nelas todas, mas hoje voltaria a estar, nelas todas, e da mesma maneira, se calhar ainda com mais arreganho. Foi lá que aprendi a hoje poder dirigir-me a vós e dizer-vos que os valores que a modernidade vos oferece, os da chamada autonomia e da responsabilidade individual só enfraquecerão o vínculo que deveis manter com os outros se hipotecareis a solidariedade – o mais belo valor da humanidade. Não há incompatibilidades para a solidariedade.
Participai, empenhai-vos na proposição das vossas causas. Não permitis que outros o façam por vós, mas fazei-o com a tolerância que cada vez mais escasseia no mundo moderno. Tende sempre presente que se ao outro não lhe assiste o direito de afirmar que o que nós pensamos é falso, está errado, é inaceitável, é mesmo ofensivo, não estamos a ser tolerantes para com ele. Se esse mesmo outro pode estar errado, dizer coisas falsas e/ou mesmo tidas por inaceitáveis não estamos a ser tolerantes.
À partida todas as perspectivas definidas pelos outros são tão aceitáveis como as nossas. E se tais ideias nos ofendem, direis vós? Paciência, diremos nós!
Tolerar é um acto de cidadania como dizia o imortal Fernando Valle.
Hoje viemos aqui porque nos indignámos com o estado das coisas, não com as pessoas.
O estado das coisas tem responsáveis. Nada nos move contra alguém. Os que me conhecem sabem-no bem. Com todos queremos manter a mesma solidariedade de socialistas que somos e vamos continuar a ser. Não abdicaremos.
A vida política democrática mesmo quando praticada entre pares não deve, no campo das ideias, deixar de ser conflituosa, privada de discussão e até de divisão, o que não pode comportar é a animosidade entre as pessoas. O Mundo não está bom mas mesmo assim acho que nunca esteve melhor. Saudades? A nós socialistas só nos compete tê-las do futuro! Há que ajudá-lo a construir se o pretendemos melhor.
Manuel da Costa (*)
(*) - Coordenador da Direcção de Campanha da candidatura de Mário Ruivo à Presidência da Federação Distrital de Coimbra do Partido Socialista.
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